Prefiro depositar a minha crença na segunda e tenciono aqui, pelo menos pontualmente, redimir-me parcialmente sem avés marias ou padres nossos, mas com a postagem de 4 trabalhos (para mim) muito especiais, cada um da sua maneira e pelos seus motivos. Começo com dois parceiros Art'ivistas.
RAPadura - Amor Popular (Bootleg)
Em Abril deste ano recebi uma mensagem no myspace deste mano... mas estava em Angola e a ligação é tão má que não consegui ouvir os sons no site dele. Uma série de coincidências se seguiram, começando pela maior de todas que era a de ter aparecido uns dias depois um convite para eu ir ao Brasil por causa do documentário É Dreda Ser Angolano. Posto lá, fui ao space do Rapadura e vi que ele era do Ceará e curti bwé o orgulho regionalista nas rimas, mas sobretudo nos instrumentais dele, atribuindo-lhes uma identidade única corroborada com uma largada feroz e de uma fome voraz que transporta no seu tom uma honestidade nos sentimentos vociferados que é cada vez mais raro num panorama musical de milhões de artistas a procura do supérfluo. Respondi a mensagem do mano dizendo que estava na terra do Lula mas que ia para Brasília, muito distante do seu nordeste. A segunda coincidência é mesmo essa, o mano respondeu dizendo "oh cabôco, eu estou vivendo aqui em Brasília com minha mãe, chega aí rapá". Pronto, umas semanas depois lá estava eu em Samambaia Sul a provar comida nordestina e a conviver com o Xique Chico, que para além de um artista devoto, é também uma pessoa maravilhosa, enorme na sua humildade e dedicação às suas actividades sociais. Este EP é uma compilação de sons seus feita por fãs e depositada na internet como EP não oficial. Já é uma boa amostra do potencial do cabra.
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01. Amor Popular
02. Andanças (ao vivo)
03. Partituras de Gravuras Mortas
04. Canto Sem fim c. MC Clayton
05. Além das Águas do Atlântico c. Chininha
06. A Quem Possa Interessar c. Gog
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Cfkappa e Xis da Questão - De C à X
Simplesmente inacreditável, este kanuko é muito mais que um rapazola assanhado saídinho das cascas, muito mais do que um atento estudioso do hip hop que percebeu como funciona o embelezamento do flow com rimas cruzadas, interpoladas, entremeadas e emaranhadas naquele já comum "isso nabiço faz isto assisto aos bicos com picos" blabla. Não. O n'dengue entrega-se a esse exercício mas sempre com um comprometimento total com o sentido das frases e a sua perceptibilidade para os ouvintes que não tenham paciência para anotar para um papel o que o artista disse para tentar decifrar. Seria inevitável fazer um post com tantos elogios e não reforçar esses elogios sublinhando que ele ainda só tem 17 anos, mas tinha 16 no momento que confeccionou esta mix com o seu parceiro no crime Xis da Questão. O Xis também transborda de talento (tem um som dele que vi cantar ao vivo que não me sai da cabeça até agora), é bastante sólido nas suas rimas e largada, mas nesta tape acaba por ser um bocado ofuscado de maneira não intencional pela opulente presença do (bastante franzino) Cfkappa. As vezes as vozes e o flow confundem-se, mas é na escrita que o mais novo dos dois mc's se destaca. Vejam por exemplo no som "C à X" no qual eles se elogiam mutuamente, as últimas linhas do verso do Cfkappa que enveredam de maneira sublime pelo universo da matemática:
"...o people diz que tu és egoista/tens muita inteligência, devias reparti-la/devias dar um terço nesses wís/ que são todos número 1 logo derivam de X/ os rappers se limitam e querem beefar contigo/ só esquecem que aqui o limite do X tende a infinito". Isso é REFINADO!!!
O Xis também tem grandes linhas tipo "Kappa és um indivíduo mau/ tu já tás maduro e nem te vi cair do pau". A escolha do "e nem" faz muito mais diferença do que possa parecer superficialmente, conseguindo um efeito muito mais engraçado do que o "mas". Fica tipo o dread está sempre atento no pau (árvore) mas o puto amadureceu tão rápido que quando ele piscou o olho o ndengue já tava no chão!
Enfim...há muito tempo que não podia dizer de uma mix inteira que ela merece MESMO a pena uma escutadela (sou tão mentiroso, ainda há umas semanas vos meti aqui a do Nokas eheh), saquem, constatem e se eu estiver enganado, vocês escolhendo apagar o mambo, darei a mão a palmatória. O FUTURO DO HIP HOP ANGOLANO (se não ficarem já inflamados antes do tempo).
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01. Intro
02. Sou o Hip Hop
03. Conto Contigo
04. De C à X
05. De Olhos Abertos
06. Felicidade do Poeta
07. Porquê Fazemos Isso
08. Ouçam
09. Punchliners
10. Kappa
11. Connosco Não!
12. Deixa Morrer Como se Deve
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Edu ZP - Só Pelo Exercício
Lembro-me de ter ouvido por alto alguns sons do Realismo Psíquico há uns anos atrás e ter ficado com uma impressão do género "epá aqui há qualquer coisa". Acho que esse qualquer coisa era essencialmente a entrega e simplicidade de um dos MC's do trio, o Edu ZP. Ele destacava-se claramente dos outros dois (Tranzas e Edinho Matahany) e é aliás o único dos três que continua hoje a fazer música. Se calhar porque está nos genes. O pai é o Marito, guitarrista dos Kiezos, uma banda mítica no panorama nacional durante os anos 80. Seja qual for a motivação motriz do Edu, ele tem vindo a crescer (em todos os sentidos, o mwadié tá bem bebuxo) sem modos nesses últimos anos, parecendo que os pratos que lhe têm sido servidos lhe causam justamente o efeito inverso da saciedade, deixando-o ainda mais faminto e mais guloso pelo microfone e procurando a excelência na performance, que é já muito impressionante (o brother tem caixa, rappa sem parar e SEM BACKS!!!). Reconhece que não é disciplinado e por esse e outros motivos, o seu álbum EDUcação ainda não viu a luz do dia, mas para saciar os seus adeptos mais fervorosos ele resolveu meter uma espécie de "teaser" em circulação e eu cá estou para difundi-lo, até porque ele inclui lá um remake de um dos meus sons que remodelamos e retocamos, acrescentando-lhe um segundo verso. Falo da "Costelinha Nómada", vulgo "chinês" que é o som de abertura deste EP. O Edu é dono de um poderoso flow, bem envolvente e cativante e como já referi, de uma agradável simplicidade nas rimas.
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01. Costelinha Nómada (6 Meses Mais Tarde) c. Ikonoklasta
02. Condecoração
03. Recolher Obrigatório
04. Experiência de Vida c. Tranzas e Edinho Matahany (Realismo Psíquico)
05. Disse c. Flagelo Urbano
06. Voz da Libertação c. Tranzas e Edinho Matahany (Realismo Psíquico)
07. Expontaneidades c. Vui Vui
08. Só Pelo Exercício
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Darksunn - Fractal EP
Sinceramente não me lembro bem como foi que nos conhecemos, há de ter sido nesse universo myspace "passa lá para ouvir" ou msn "foi o dred lambda que me passou o teu contacto", mas acabei por sacar este EP dele e ficar completamente aturdido com a qualidade de produção do rapaz. Há uma mais do que evidente influência do RJD2, mas ainda assim o som consegue ser característico, único e, sobretudo, completamente ao lado de TUDO o que se faça nesse género em Portugal, ou pelo menos TUDO o que conheço, ou TUDO o que é divulgado. Hoje em dia já começa a haver espaço para cenas mais alternativas tipo o DJ Ride (ainda tenho de ouvir isso), ainda assim, muito timidamente se vai dando passos na promoção dessa diversidade. O Darksunn pertence a um colectivo da margem sul de Lisboa chamada Triplo 7 Produções e está neste momento a trabalhar com o Stray, um MC do Porto, num projecto chamado I Robot. Este EP podia ser de qualquer país no mundo, é essencialmente instrumentais com samples de voz e está 5 estrelas. Altamente aconselhável.
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1. It Came From The Sky
2. Causalidade
3. Deus Ex Machina
4. Diatrabalhonoite
5. Realidade
6. Marina
7. Página 7
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